Grace e Frankie: o fim de um seriado que deixou legado

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Grace e Frankie chegou ao fim. E no começo parecia pouco provável de o seriado se tornar o mais longo da Netflix (até agora), com sete temporadas.

Afinal, estamos falando de um elenco principal septuagenário. Não há dragões voando ou robôs “transformistas”.

Trata-se de duas atrizes de gerações anteriores ao mundo tiktokiano, e um enredo que, no ano de sua estreia, já prometia algum alvoroço: a vida de Grace e Frankie, mulheres nos seus setenta e poucos, de temperamentos completamente distintos, vira de cabeça pra baixo quando seus maridos revelam que vivem uma história de amor secreta há muitos anos.

A primeira cena do episódio de estreia promete uma deliciosa comédia pastelão daquelas, com os quatro monstros da sétima arte (Lily Tomlin, Jane Fonda, Sam Waterson e Martin Sheen) sentados num restaurante 5 estrelas para “a grande revelação”. Frankie e Grace acham que eles vão se aposentar e viver “em paz”, ou algo parecido.

Quando os dois revelam que vão terminar o casamento com Grace e Frankie porque estão apaixonados, começa uma cena de confusão à lá “Torta na cara”, com massa, espumante e garfos voando por todo lado. A paz acabou, para nosso total deleite.

É aí que começa a história escrita por Marta Kauffman (que também escreveu Friends) e Howard Morris.

Não são seus belos corpos que movem o enredo. Nem necessariamente a temática LGPBTQIA+. É o impacto da mudança de vida no mundo desses quatro experientes que vai gerar a comédia e o drama.

Elas não se suportam: Grace é metódica, sistemática, pragmática, uma capitalista de mão dura, que construiu um império com seu tino para os negócios, e não dispensa um bom Gim.

Frankie é uma hippie pós-moderna, sem nenhum pragmatismo, vegana, adepta de danças ao redor da lua, xamanismo e esoterismo para resolver problemas do dia dia, como simplesmente achar onde deixou o celular.

Da Frankie esperamos os comentários mais inúteis que, sem pretensão nenhuma, casam bem em qualquer situação. Da Grace, vem o foco necessário pra fazer algo acontecer. Frankie acerta o gol mirando na trave (e nos duendes e seres mágicos sentados nela) e Grace acerta o gol mirando na rede.

É nesse conflito que a trama caminhou ao longo de 7 temporadas, com muitos diálogos bem amarrados. Apesar de ser, na essência, uma boa e tradicional comédia (e melhor ainda, sem risos gravados!), é possível chorar em questão de segundos de uma cena pra outra. Trouxe para a frente das câmeras um elenco realmente brilhante, um texto afiado, de primeira qualidade.

Abordou temas como a sexualidade na velhice (na temporada em que são empreendedoras, as amigas criam um pênis de borracha especial para senhoras da idade delas, que sofrem com problemas como artrite, mas não querem perder o direito ao prazer); amor; saúde; solidão, a ausência dos filhos, o preconceito com os idosos, e muito, muito, muito mais.

O seriado desmistifica a terceira idade, tira o peso e o carma dessa etapa da vida, colocando tempero de graça e drama na medida e no tempo ideal (cada episódio tem no máximo 30 minutos). Nem todas as piadas funcionam, assim como nem todos os momentos (o elenco de apoio, de jovens, é bom, principalmente June Diane Raphael, que faz a filha de Grace: ela faz rir sem mexer um centímetro do rosto, com puro deboche e sarcasmo).

Para quem busca uma fonte segura de diversão, emoção e bons momentos, o seriado é uma dica infalível. Não fiquei triste pelo seu fim. Cumpriu bem sua (longa) missão.

Inclusive, deixou “primos”, como “O Método Kominsky” (igualmente maravilhoso), que também segue uma linha narrativa bastante similar e lança luz para os dilemas, dores e confusões do mundo dos mais experientes.

Grace e Frankie traz esperança, alento, alegria e um sopro de otimismo, inclusive, para os mais jovens (que pensam serem o centro do mundo).

Nem tanto realismo, nem tanto escapismo: um pouco de cada, pra dar contraste à vida, com seus pesos, levezas, encontros e despedidas. Que venham muito mais trabalhos da Lily e da Fonda (sim!) e que o envelhecimento nos traga algo mais do que os clichés das cruzadinhas, dentaduras caídas e o nhoc nhoc das cadeiras de balanço.

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